Quem desejou viver para sempre? Quem criou a história,
através do nascimento da palavra, desejou viver para sempre, e amar para sempre.
O Criador Inicial construiu a primeira fábrica, seguindo
ordens superiores. Foi a mais rudimentar, a mais pequena e a mais emblemática de
todas. A usina ficou eternizada pelas misteriosas luzes vermelhas, brancas e azuladas
que saíam projetadas pelas paredes negras do edifício sempre que uma nova palavra
era gerada. Saíam minúsculas, ímpares grãos microscópicos com energia capaz de eternizar.
E cantavam. Sonatas ecoavam do interior da construção após cada nascimento, luzes
coloridas bailavam numa alegria esfuziante quando recebiam os seres milagrosos,
e o espetáculo grandioso parecia não ter fim.
Palavra após palavra, aos primeiros historiadores tinha
sido dada, finalmente, a possibilidade de iluminar o futuro, de encontrar novas
formas de perpetuar o presente com palavras tenras. Os sábios que edificaram a fábrica
precisaram de aprender a escutá-la enquanto esta laborava no máximo da suas capacidades,
para lhe aperfeiçoarem o funcionamento, e demoraram muitas gerações até o conseguirem.
Por essa altura já milhares de outras fábricas tinham sido construídas, réplicas
imperfeitas da primeira. Nunca conseguiram alcançar a glória desse feito incrível,
e acabaram por definhar à sombra da construção inicial, que cresceu desmesuradamente
até ao trágico dia da Grande Destruição.
As paredes cresceram em todas as direções, e a fábrica
expandiu-se com soluções criadas para providenciar o necessário apoio ao nascimento
de todo o tipo de palavras. Com o passar dos séculos, a dimensão do projeto começou
a levantar problemas que ninguém antecipara. Laboratórios científicos começaram
a testar as teses de peritos a pedido do Construtor Inicial, apesar de ele ter jurado
nunca mais se intrometer nos destinos do empreendimento, mas a honestidade de alguns
dos engenheiros-chefe foi posta em causa e alguma coisa tinha de ser feita. Tornara-se
imprescindível descobrir os defeitos causados pela inadmissível incompetência das
chefias antes que fosse tarde demais.
Queixas, umas atrás de outras, foram escutadas. Confissões
foram proferidas, e um prazo de dois anos para a recuperação e renovação da fábrica
acabou por ser a estimativa do tempo necessário para esse efeito.
Dois anos!
Dois anos de espera, e só então nasceria uma nova palavra
depois de Efémera, que não fazia a mais pequena ideia da tarefa gigantesca que a
aguardava.
Uma palavra mais velha descansava ao seu lado. As duas
seguiram assim, aconchegadas e quentes, no interior da carruagem de madeira do famoso
historiador, que não tinha grande pressa em chegar ao destino. O homem entretinha-se
a beber aguardente velha por um pequeno cantil metálico que herdara do avô na adolescência,
e o cheiro a álcool, que era impossível de disfarçar, entranhou-se por toda a parte.
Sem comentários:
Enviar um comentário